segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A Origem

O melhor filme do ano! Não se espante caso esta frase traga uma sensação de déjà-vu, mas, pouco mais de dois anos depois do melhor filme do ano, Christopher Nolan conseguiu de novo. A Origem não é apenas o blockbuster mais cerebral e instigante de 2010, mas é uma trama original, o que a contento é um ponto mais que positivo em meio a enxurrada de remakes, continuações e adaptações que adornaram a temporada. Nolan, a exemplo de seu filme anterior, conseguiu subverter um gênero - no caso, os triviais filmes de roubo - e elevá-lo a outro patamar, dando-lhe aspecto de ficção científica dentro dos fundamentos da onirologia. Um filmaço.

Taxado e tratado como complexo, A Origem não é nenhum bicho de sete cabeças. Pelo contrário. Nolan não criou nenhum divisor de águas no cinema, apenas uma obra espetacular e original, com inteligência acima da média, e que, apesar de ser para todos os gostos, serei bem sincero, não é para qualquer um. Querer explicar A Origem é querer estragar a experiência. Experiência esta que necessita ser vivenciada por qualquer um que goste de cinema. Basta apenas que se saiba de seu enredo, onde um ladrão fugitivo internacional especializado em extração de segredos valiosos das profundezas do inconsciente durante o sono tem como último trabalho, sua chance de redenção, ao invés de roubar, conseguir implantar uma idéia na mente alguém. Como eu disse um pouco antes, não há nada de complicado. Nolan faz questão de entregar tudo bem mastigado, explicando detalhadamente cada passo a ser dado pelos personagens. E diferentemente do que se pense, que tanta informação possa deixar o desenrolar da história cansativo ou óbvio, um aviso: elas intensificam a “viagem”. Christopher Nolan caprichou na ambientação e passeia por diversas camadas da trama (graças a um trabalho excepcional de edição) sem jamais perder o foco principal. Acredite, você vai descobrir como é estar num sonho dentro de um sonho de um sonho.

Mas, de nada adiantaria uma bem estruturada narrativa sem o equilíbrio de um bom elenco. E em meio a um leque de ótimos atores (Ellen Page, Tom Hardy, Joseph Gordon-Levitt, Ken Watanabe, Cillian Murphy, Michael Caine), quero destacar os excelentes trabalhos de Leonardo DiCaprio e Marion Cotillard. O primeiro, no papel do protagonista Dom Cobb, há muito se desvinculou daquela imagem de galã juvenil criada depois de Titanic. DiCaprio amadureceu, passou a escolher projetos ousados, trabalhou com diretores do alto escalão (Martin Scorsese, Ridley Scott, Steven Spielberg) e adquiriu confiança para assumir qualquer papel. E ao ganhar a oportunidade de ouro de Christopher Nolan de encabeçar o elenco de A Origem, provou mais uma vez que tem qualidade e merece os parabéns por desenvolver tão bem um personagem ambíguo e dar-lhe uma carga dramática bem dosada, sem exceder na pieguice. Já Marion Cotillard tinha um trabalho aparentemente mais fácil, porém, deu uma profundidade tão intensa a personagem que chegou a roubar as cenas cada vez que aparecia. Marion além de bela é uma atriz espetacular. No papel da esposa morta de DiCaprio, vista apenas como “a sombra” no mundo dos sonhos, ela abraçou toda a complexidade da personagem e deu-lhe uma energia além do exigido. Com seu olhar penetrante e meio blasé, conseguiu facilmente persuadir o protagonista e a platéia.

O diretor aproveitou as possibilidades impossíveis dos sonhos, além da inconsistência dos personagens neste mundo, para ampliar o grau de suspense da trama. Fã de enigmas e famoso por embaralhar seqüências, o diretor parece ter aprendido bem a lição com o mestre do suspense Alfred Hitchcock e criou o mais longo e tenso clímax da história do cinema. Com o apoio da trilha sonora ensurdecedora de Hans Zimmer, Nolan gerou um tour de force quase interminável, fazendo o público ficar na ponta da poltrona de tanta ansiedade. E apesar de todo tempo gasto, nada é jogado por acaso e a mente ainda passa por um processo de confusão de idéias. O diretor faz um jogo óbvio com você, ditando as próprias regras, embasbacando sua mente, inserindo alguns alívios cômicos genais (como as cenas dos personagens em estado REM na van numa perseguição alucinante) e te enchendo de detalhes para construir um verdadeiro quebra-cabeça. Ao final, depois do alívio de estar tudo resolvido, num caminhar para um happy end, depois de todas as idéias no lugar, Nolan ainda implanta uma dúvida no espectador. Fica a pergunta do personagem de Michael Caine em outro filme do diretor, O Grande Truque, como dica para quem não assistiu A Origem: “Você estava olhando com atenção?”. Pois é. E afinal, ele saiu ou não saiu?

NOTA: 10