domingo, 20 de março de 2011

COMUNICADO

Gostaria de primeiramente desculpar-me com todos os que visitam meu humilde Blog pela demora nas atualizações das críticas. Gostaria de dizer também que, apesar da ausência de 3 meses, coloquei uma crítica recente, a de Cisne Negro. Aproveitando também a chegada de Tropa de Elite 2 em DVD, publico a resenha já feita desde Outubro do ano passado, época que assisti o filme no cinema. Outra crítica também antiga, a de Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 1, só será publicada um pouco antes do lançamento da parte 2 em Julho, pegando carona na estréia. Gostaria de dizer que em breve o Blog estará com novidades estéticas aproveitando as estréias dos filmes de 2011. E prometo que serei mais pontual com as críticas. Saudações a todos e boa leitura.
Henrique Lima.

Cisne Negro

Bom, a essa altura não é mais nenhuma novidade o fato de Natalie Portman ter recebido o Oscar de Melhor Atriz por seu trabalho em Cisne Negro. O que poucos realmente sabem é que, sem desmerecer as demais concorrentes, a Academia foi mais do que justa. O Oscar não lhe foi dado por nenhuma estratégia de marketing, nem como pedido de desculpas por não ter sido premiada anteriormente. Natalie Portman ganhou por merecer. Seu trabalho neste filme é desafiador. Um trabalho que nas mãos de outra atriz menos talentosa, talvez não tivesse o mesmo impacto. Natalie é sincera em sua interpretação. É a dona de todo o longa-metragem. É a força da natureza que devasta toda a tela e segura e mantém a qualidade do filme. É o cisne que embeleza o lago.

Cisne Negro é um filme modesto. Falo isto não para desmerecê-lo, muito pelo contrário. Falo pelo fato de resgatar o cinema em sua essência como arte e não como espetáculo. Longe de ser uma superprodução, ou exibir técnicas cinematográficas inovadoras para surpreender a crítica, o filme do diretor Darren Aronofsky é simples e conciso. Conta uma história comum de uma bailarina que quer ascender na carreira e surpreende pela forma como é desenvolvido. E apesar de ter o balé e todo o seu mundo lírico e clássico como pano de fundo, não é um filme sobre dança. Ao abraçar uma estética mais independente para narrar a história de Nina Sayers (Portman), Aronofsky abandona de vez a idéia comercial e egocêntrica de fazer experimentalismos existencialistas (Fonte da Vida) e retoma as rédeas de sua carreira ao voltar ao tipo de cinema que o lançou. Cisne Negro não é um mero drama e pouco lembra a pieguice de filmes recentes sobre balé como Sob a Luz da Fama e Dançando para a Vida, por exemplo. Aronofsky criou um pesadelo imerso em toda a simplicidade e graciosidade do mundo da dança. Um horror psicológico onde sanidade e devaneio andam de mãos dadas. Uma obra delirante que pode não agradar a todos os públicos, mas que atesta certa maturidade de seu realizador.

Cisne Negro é por vezes onírico, a começar pelo seu prólogo. A excepcional cena de abertura inicia de forma sensível e vai ganhando ares assustadores no seu desenrolar. A cena mostra um pouco do que está por vir e um pouco da personalidade sonhadora e um tanto insegura da protagonista. Nina é uma bailarina dedicada e, de certo modo, ambiciosa. Ao ganhar o papel de Rainha Cisne numa nova versão de O Lago dos Cisnes, o apogeu de qualquer bailarina, ela sofre com a pressão externa e psicológica da responsabilidade. E é aqui que entra os trabalhos extraordinários do seu realizador e de sua intérprete. Nina vai se tornando aos poucos paranóica e passa a enxergar uma concorrência desleal vindo de Lily (Mila Kunis, sóbria). Mas Nina, mesmo sabendo que sua obsessão está lhe consumindo, continua sua busca pela perfeição na realização de seu sonho mesmo que isto resulte na deterioração de seu caráter ou mesmo na destruição de sua vida. Ao longo da jornada ao inferno pessoal da protagonista é impossível não notar as semelhanças propositais do diretor com os protagonistas de Pi e Réquiem para um Sonho, seus primeiros trabalhos. E é evidente a segurança com a qual o diretor confia o filme a Natalie Portman. A atriz realmente se entrega de corpo e alma a personagem. Apesar de um ou outro deslize de canastrice (principalmente quando a atriz insiste em carregar uma expressão chorosa de desespero), seu trabalho é primoroso. Aronofsky jamais a tira de foco, seja perseguindo-a como uma entidade ou rodopiando nauseantemente ao acompanhar seus passos de dança. A trilha sonora pontuada pelas músicas de Tchaikovsky dá o tom dramático da personagem e engrandece a soturnez da trama. Cisne Negro é um filme belo, denso e sombrio. Um trabalho feito com maestria e executado com precisão. Uma obra divina e marcante.

NOTA: 9,0

Tropa de Elite 2

Tropa de Elite 2 é um filme de macho! Não na aceitação de ser um filme de ação agressivo ou mesmo feito só para homens. É um filme vigoroso que remete ao tipo de cinema tenso, rude e viril exercitado, por exemplo, por diretores como John Huston, Sergio Leone e Walter Hill. Tropa de Elite 2 é um filme corajoso. É um drama de ação niilista que expõe a realidade nua e crua, sem arrodeios ou omissões, sem qualquer tom de sátira ou ativismo político. Tropa de Elite 2 escancara a realidade para nos fazer sentir vergonha das instituições que deveriam servir para nos amparar. É literalmente um soco no estômago de cada cidadão. Tropa de Elite 2 é o melhor filme brasileiro da década, quiçá do século. Digno de orgulho e capaz de superar seja em qualidade e estética, até o mais caro dos blockbusters norte-americanos.

Não dá para falar de Tropa de Elite 2 sem primeiramente falar de seu diretor, José Padilha. Padilha é, sem dúvida, o mais audacioso cineasta nacional em anos. Um filho bastardo da publicidade que ousou levar a crítica social a âmbitos reacionários adequando tudo a um cinema documental e estilístico. Padilha não tem medo de apontar o dedo na cara de alguém e muito menos culpar o poder público por sua própria degradação. E ao lado do roteirista Bráulio Mantovani criou uma história em que qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência. Só por isto merece ser ovacionado de pé. Tropa de Elite 2 era um filme de lucro certo, amparado pela aura do sucesso/polêmica do longa original de 2007. E mesmo com toda essa certeza, José Padilha não se acomodou em fazer um mero mais do mesmo. Deu uma guinada de 360º na história do BOPE e construiu um filme perfeito, superior a seu precursor. Outra salva de palmas para ele.

Passados mais de dez anos entre as duas histórias, o eixo principal pode ser o mesmo (a polícia e o BOPE), mas a temática agora é outra. Sai a criação do Batalhão de Operações Especiais e entra a criação da Segurança Pública. Padilha nos faz mergulhar nas entranhas da máquina do estado. Um mergulho de certo modo curioso e que aos poucos vai se tornando sádico até terminar por vergonhoso. Padilha expõe um mundo obscuro - o nosso mundo cotidiano! -, corrupto, inconseqüente, sujo e amoral. Um mundo que a gente sabe que existe e insiste em omitir. Um mundo onde fazer o dever de casa é manter a ordem política tradicional a cada dois anos, abdicando do bom senso e colocando sempre as mesmas pessoas ou gente incapaz (humoristas, artistas, jogadores de futebol) para reger a organização de tudo. Um mundo onde a violência, apesar de chocante, é corriqueira e natural. Uma violência desmedida e interminável, brutal e insensível, surgida não somente como resposta a ela própria, mas como forma justificativa dos meios. Um mundo que nós lemos nos jornais, nas revistas, assistimos na TV ou simplesmente contemplamos da janela.

Mas em meio a todo o caos há alguém que insurge com força para se opor ao conformismo. E no caso de Tropa de Elite 2 esse alguém é o tenente-coronel Nascimento. Nascimento é o nosso Superman, nosso James Bond, nosso Jason Bourne, nosso Jack Ryan. Nascimento é a indignação nacional. É o que cada um dos formadores de opinião gostaria de ser. Um personagem destemido e agressivo que não teme peitar os próprios colegas ou superiores, que não se omite na frente de bandidos ou políticos, até do maior deles se possível. De nada adiantaria ser a espinha dorsal do longa sem alguém que o fizesse com garra. Daí entra o trabalho extraordinário de Wagner Moura (sim, o melhor ator brasileiro da atualidade!). O baiano franzino desaparece para dar lugar ao carrancudo, rigoroso e incorruptível Nascimento. Ainda fascista e cada vez mais anti-social, Nascimento agora é secretário de segurança do estado do Rio de Janeiro. E é dali onde começa uma guerra pessoal contra o sistema, arriscando sua vida e a de sua família em nome da honra. Tropa de Elite 2 é um filme que precisa ser vivenciado não apenas pelos amantes do bom cinema, mas por todos os brasileiros. É um filme de discussões e teses. A melhor coisa que o Brasil produziu em 2010. Uma história que te faz querer ser um “caveira” e sair do cinema botando ordem em tudo. Só que fora da sala escura a esperança de paz ainda é um sonho distante. O mundo é aquele que vimos há pouco e que nos envergonha. E onde ninguém faz nada para mudar. Um sistema foda!

NOTA: 10