quarta-feira, 30 de julho de 2008

Batman - O Cavaleiro das Trevas

O melhor filme do ano! Indiscutível. Incontestável. Absoluto. A desvantagem de ser cinéfilo metido a crítico, é que é quase impossível ser imparcial nas resenhas. Não dá pra ser com Batman. Logo de cara vem aquele eterno dilema cinematográfico: pode uma continuação ser melhor que o filme original? A resposta, como já se foi provado algumas vezes, é sim. No caso de O Cavaleiro das Trevas, o dilema é outro: existirá alguém que faça qualquer coisa melhor doravante? Duvido. Não se trata apenas de um filme. Estamos diante de um evento cinematográfico do porte de um ...E o Vento Levou, um Ben-Hur, um O Poderoso Chefão. É um épico. No final da sessão você fica com a impressão de que viu a história acontecer. Críticos preconceituosos e velhotes antiquados sem infância tomem essa: a partir de agora, os filmes de heróis baseados em HQs subiram de nível e já podem figurar facilmente no panteão dos clássicos. Quem diria.

Antes do filme estrear, o que se ouvia era que O Cavaleiro das Trevas seria o Matrix Reloaded dessa nova franquia. Pois bem, depois de assisti-lo, conclui que o longa está mais para O Império Contra-Ataca. Tal qual o capítulo do meio da saga criada por George Lucas, este Batman evolui na qualidade, amplia a mitologia, deixa o clima mais sombrio e pesado, bombardeia o espectador com reviravoltas de arrepiar e aumenta a dose da ação, tornando-a necessária para o desenrolar da trama. E que cenas de ação, hein!? Sem falar que vemos o vilão mais insano dos quadrinhos se tornar o maior vilão da história do cinema. Esqueça a interpretação espalhafatosa de Jack Nicholson no filme de Tim Burton. O Coringa desse novo Batman é mais perigoso e anárquico que qualquer outro que se tenha notícia. É bom que se saiba que eu voto a favor do Oscar póstumo a Heath Ledger. E não o de coadjuvante, mas o de ator principal, afinal, o filme é todo dele. Em nenhum mísero instante você consegue enxergar ou lembrar do cara que já foi cowboy gay e galã cabeludo de filme teen. O que vemos é um ator de verdade, sem maneirismos, dando tudo de si sem se esforçar, rendendo mais que o esperado e encarnando, literalmente, um ser complicado, sem alma, passado ou futuro. Alguém que não tem nada a perder e não está nem aí pra ninguém. O Coringa aqui ainda é um palhaço. Só que não mais daqueles que só te fazem rir, mas dos que te fazem chorar de medo. Se o filme merece todos os elogios que anda angariando, é por conta de Heath Ledger.

Mas não é só isso. Para se tirar dez numa prova, você precisa acertar todas as questões sem errar uma vírgula sequer, correto? Christopher Nolan assim o fez. E até mais do que precisava. Se você olhar bem, vai notar que Bruce Wayne/Batman tem o mesmo destaque que todos os outros personagens. Todos têm o seu momento. Todos têm o seu mérito. Não estão ali apenas para fazer figuração, eles são parte da trama, parte da vida de Batman. E Nolan dá espaço para grandes atuações de todos. Ponto para Christian Bale e Gary Oldman que, como veteranos, abraçam de vez seus personagens. E para Aaron Eckhart que descobriu a essência de Harvey Dent, o “cavaleiro branco” e do vilão Duas-Caras, criado, como Batman, da tragédia. Só resenti que a Maggie Gyllenhaal tenha tido menos tempo de cena que sua antecessora no papel de Rachel Dawes, Katie Holmes. Mas sua saída era necessária. Era um dos catalisadores do caos. Falando em caos, diga-se que o filme é sobre ele. Sobre descontrole e insanidade. E Nolan provou mais uma vez que é um dos melhores diretores deste século, pois em meio a tanta bagunça, tramas paralelas e reviravoltas, ele não perdeu sua sanidade e o controle em momento algum.

Digamos também que o filme é sobre a linha tênue que separa o herói do vilão, a razão da emoção. É sobre perdas, sobre responsabilidade, sobre escolhas e decisões difíceis. É sobre achar sua cara-metade, a parte que completa sua personalidade, seja ela um palhaço sádico, seja ela parte do seu rosto desfigurado. É sobre bem e mal e sobre como os dois podem ter o mesmo peso numa balança. Some-se a tudo isso uma fotografia dark grandiosa (Oscar?) e cenas de te fazer pular de emoção da poltrona e o resultado final, é sim, o melhor filme do ano. Pena que o espaço aqui é limitado, porque eu poderia passar o dia inteiro falando bem de O Cavaleiro das Trevas. Para mim, o ano pode se encerrar aqui.

NOTA: 10

Juno

Olha, eu não sou hipócrita. Filme bom de verdade pra mim tem que me deixar feliz dos créditos iniciais ao finais. Tem que me surpreender. Juno estava há pouco na minha lista de prioridades. Porém, admito, fui assisti-lo com um certo medo de me decepcionar, algo comum de minha parte ao gerar expectativa demais perante tantos elogios e críticas positivas. Mas, que surpresa foi a minha quando o filme acabou. Descobri que o melhor filme do ano passado era o mais improvável de todos. Se os irmãos Coen, Paul T. Anderson e Ridley Scott provaram ao mundo como se faz cinema de verdade, Jason Reitman, diretor de Juno, quis apenas contar uma corriqueira história de amor. Apoiado no roteiro extraordinário de Diablo Cody, ele não fez só um filme. Perpetuou um clássico. Pode ter certeza.

A espinha dorsal do longa é a simplicidade. É o fato de que as melhores coisas da vida se escondem nos atos mais simples do nosso cotidiano. E a Juno interpretada por Ellen Page é a personagem feminina mais completa já vista no cinema desde Scarlett O’Hara. Sério. Juno é tipo de garota que qualquer um queria ter como namorada; qualquer pai queria ter como filha e qualquer garota daria a alma para ser. Se seu parceiro em cena, Paulie Bleeker (o péssimo Michael Cera), é sem sal demais, Juno é um sachê de Sazon, que realça o sabor e dá cor a todas as cenas que os dois fazem juntos.

Juno pensa, fala, age e ama diferente de qualquer adolescente que você conheça. Por isso não é um estereotipo, nem um clichê - é apenas melhor que todas as outras. E o fato de ter engravidado num vacilo, mesmo com a maturidade que tem, não altera sua personalidade. Tudo no filme é perfeito. Olha, a opinião é pessoal, mas para qualquer um que tenha um pouco de sensibilidade e realmente goste de cinema, não há porque discordar da afirmação. A trilha sonora e a fotografia indie, a edição caprichada, os diálogos... ah, os diálogos. Eles fluem com uma naturalidade tão grande que a cada novo fotograma uma pérola é proferida por alguém. São tantas palavras expressivas, tantas citações, tanta cultura pop que a Diablo Cody mais parecia um Tarantino de saias. Só ele mesmo para inserir uma discussão sobre clássicos de H. G. Lewis e Dario Argento sem parecer banal. Os coadjuvantes também ajudam no resultado final. J. K. Simmons está exemplar como o pai moderno de Juno. Jason Bateman e Jennifer Garner como o casal que adotará a “coisa” que Juno carrega no ventre também. O primeiro representa a ala masculina frustrada com a vida que leva. Alguém que precisa reavaliar sua vida e o seu conceito de amor. Sua alma gêmea pode estar no lugar em que você menos imagina e não na mulher mais bonita que você encontra. Já ela representa a ala feminina careta, a ala daquelas parceiras que privam os maridos e namorados do que gostam só porque aquilo as desagrada. Mas demonstra uma sensibilidade fora do comum. Enfim, os superlativos, como se vê, são intermináveis.

Para encerrar, li uma crônica do jornalista Dagomir Marquenzi há alguns dias, que fala a respeito das seqüelas que os grandes filmes deixam na gente. Pois bem, Juno deixou uma seqüela irreversível em mim. No desfecho da obra, quando Juno e Paulie formam um dueto e entoam a belíssima Anyone Else By You, eu queria mais algumas horas de Juno no meu DVD. Me enchi de falsa esperança de ver um impossível Juno 2 ou Juno 3. A adolescente Juno, com ou sem barriga, era o que eu queria que minhas filhas fossem. Só não sei se seria um pai compreensivo como o dela. Bom, é melhor parar a conversa por aqui.

NOTA: 10

Kung Fu Panda

Meu filho de 5 anos praticamente não riu quando assistiu Kung Fu Panda. Eu também não. Mesmo assim, a nova animação da Dreamworks é divertida pra caramba. Não espere a ironia inteligente de Shrek. Nem os bichos neuróticos de Madagascar. Ou mesmo a crítica escancarada de Os Sem-Floresta. O que temos aqui são bichos fofinhos que lutam Kung-Fu. É uma história de obstinação, de confronto entre o bem e mal, recheada de filosofia oriental e muita lição de moral. Vendo por este lado, o longa não faria feio se trouxesse o slogan da Disney na abertura. Entretanto, há um diferencial: a dose cavalar de humor. Só que, neste caso, não aquele humor sarcástico e histriônico que é marca registrada daquelas animações citadas, e sim, o pastelão, daqueles que enrubesceria qualquer personagem metido a engraçadinho do estúdio do Mickey; daqueles simples e inocente, igualzinho o protagonista do longa.

Mas se o humor é babaca e só agrada às crianças igualmente babacas (você riu?), a animação é de encher os olhos. Se Wall*E quis provar que poderia extrapolar os limites entre a animação e a realidade, Kung Fu Panda faz questão absoluta de mostrar que é, legitimamente, uma animação. E que limites também podem ser quebrados dentro do próprio gênero. Isto é o legal do filme. Seu início vertiginoso, narrado em tom de fábula pelo protagonista Po, mais parece um desenho de Genndy Tartakovsky. Segue-se a ele a história do panda balofo que quer ser lutador de Kung-Fu e acaba, involuntariamente, caindo no caminho da escolha do novo Guerreiro Dragão, surpreendendo a todos e a si mesmo. Bom, basta ter 5 anos para saber que fim o longa vai tomar, mas até lá, somos agraciados com cenas espetaculares de luta e paisagens deslumbrantes. Se existisse Oscar de Melhor Fotografia para um longa de animação, Kung Fu Panda seria o grande candidato à vitória.

Só que o filme não é panda o tempo inteiro. Além de Po, ainda temos os Cinco Furiosos (a Tigresa, a Garça, o Louva-a-Deus, a Víbora e o Macaco), o mestre Shifu e o vilão Tai Lung. Estes dois últimos são o destaque do longa. O primeiro, sábio e ágil, parece uma mistura de Yoda com Pai Mei. O segundo, ágil e mortal, bem que parece com Jet Li em seus raros momentos de vilania. Pois é, e as referências, outra marca registrada da Dreamworks, não param um só instante. É quase impossível não ficar puxando pela memória a penca de filme de artes marciais que você conhece e que, com certeza, serviram de inspiração para algum lance da animação. Mas aqui, as lutas deslancham sem a necessidade de cabos. Por serem animais de movimentações distintas - e por ser um desenho, claro -, a agilidade com que lutam é crível o bastante a ponto de nos deixar com um sorriso infantil no rosto quase o tempo todo. Resumindo tudo: genial.

E se o protagonista em sua santa inocência, apesar do carisma e da simpatia, não convence como guerreiro e só te faz rir (ei, essa era a intenção, não era!?), os coadjuvantes temperam o caldo. Entre cenas de cair o queixo (a fuga de Tai Lung e a luta na ponte são bons exemplos), humor infantil e um desfecho moralistamente óbvio, salvaram-se todos. Agradou a meu filho. Agradou a mim também. Mas, quem sabe eles não melhoram numa possível seqüência. Nós dois estaremos lá de novo, pode ter certeza.

NOTA: 9,0

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Cloverfield - Monstro

Eu juro que não vomitei. Nem fiquei enjoado. Muito menos tonto. Agora, uma coisa é certa: a câmera na mão que registra todo o longa Cloverfield - Monstro é um recurso, por vezes, cansativo. Eu, em minha santa empolgação, às vezes gritava inconsciente ao cinegrafista: “Segura essa merda direito!”. Coisa de nerd. Pois é, e foi justamente por eles (e pra eles) que Cloverfield nasceu. Para o bem, óbvio.

Em meio a tanto caos e destruição, a sensação de insegurança que ronda o filme é quase palpável. Depois dos atentados ao World Trade Center em 2001, qualquer metáfora sublinhar vira paranóica coletiva. É como se fossemos inúteis perante um mal desconhecido. “Será que são terroristas?”, pergunta alguém após o primeiro impacto à chegada de, er, algo. E é aqui que o filme realmente começa. Minutos antes somos apresentados rapidamente aos protagonistas numa festa de despedida de um deles, Rob (Michael Stahl-David). Tudo devidamente registrado numa câmera digital. Eis que de repente, o susto dá lugar a curiosidade. A curiosidade - mesmo ante um perigo eminente - dá lugar ao fascínio (como na cena espetacular da cabeça da Estátua da Liberdade caindo no meio de Nova York). Até que o pânico e o desespero vem a tona e tomam conta de todo mundo. Se não fosse a maldita campanha de marketing viral que tomou a internet e transformou o filme em cult antes mesmo de estrear, a agonia proporcionada pelo medo do desconhecido também tomaria conta da platéia. Sem falar no desnecessário subtítulo nacional que, de cara, já estraga a surpresa. Mesmo assim a tensão ainda é crônica.

Mas, e o filme, é bom? Com certeza. Principalmente por conta de sua metragem (84 minutos), que não deixa a destruição desenfreada exceder os limites da paciência. Porém, mesmo curto, parece que o filme não vai acabar nunca. Juro por Deus. E, como eu disse no início, o corre-corre e câmera na mão, além da escuridão, deixam-no arrastado e, de certa forma, cansativo. De ruim, só. Não me importam certos detalhes supérfluos do tipo ‘por que a bateria da câmera não acaba’ ou ‘por que o cara continuava a filmar no meio de tanta destruição’; isto eu deixo para aqueles cinéfilos-cabeça que querem achar defeitos óbvios em um longa de ficção (dããã). Para quem gosta mesmo de filmes de monstros e de uma boa ação despretensiosa, Cloverfield é um prato cheio. E fora a inspiração nítida em Godzilla e no bagre gigante do recente O Hospedeiro (digamos que o tal monstro seja uma mistura dos dois), esta pérola produzida e idealizada por J. J. Abrams é um caldeirão de referências pop. Fazendo uma comparação bizarra, Cloverfield é uma mistura improvável de A Bruxa de Blair com Vôo United 93. Como esses dois longas, também é uma experiência e tanto.

NOTA: 8,5

Antes Só do Que Mal Casado

Vou lhes contar uma coisa sobre os irmãos Farrelly: os dois são mestres no segmento do humor grosseiro e escatológico. Você já sabia disto? Que bom. Só que, justamente por ostentar esse título entre o público, eles acabam o desgostando a cada novo longa-metragem. Eles nos devem uma nova comédia babaca nos moldes de Debi & Lóide e Kingpin. Chega de tentar ser romântico perante tanta situação inconveniente. Os caras padecem da Síndrome de Shyamalan (ou Shyamalan padece da Síndrome Farrelly, tanto faz). Tal qual o diretor indiano, os irmãos sempre deixam a expectativa de um novo filme à altura de seu maior sucesso. A diferença básica é que, Shyamalan, depois de O Sexto Sentido, conseguiu fazer outras obras-primas de tamanha importância, apesar dos protestos. Já os Farrelly, depois de Quem Vai Ficar com Mary?, tentam - e não conseguem - fazer sempre outro Quem Vai Ficar com Mary?. Eita, carma. Earl explica...

Este Antes Só do Que Mal Casado não foge a regra. O filme até que é bom, arranca altas risadas em determinadas cenas em sua primeira parte, com piadas de extremo mau gosto (e sem gel no cabelo). Mas em sua segunda parte... é aí que residem todos os problemas da comédia. Onde foi que eles erraram? Justamente no ponto de tentar salvar um filme que não estava precisando - e nem querendo - ser salvo com romantismo desnecessário. O que começou como uma comédia engraçadíssima terminou como uma comédia romântica piegas.

Na primeira parte, temos Ben Stiller (bisando a parceira com os Farrelly de Quem Vai Ficar com Mary?) e a loira Malin Akerman dando um show de humor nas situações mais histéricas e constrangedoras possíveis (esperem para ver as cenas de sexo entre os dois). Além de um Jerry Stiller, pai do protagonista dentro e fora das telas, sacana e desbocado. O que surpreende nesta primeira metade, é que a força motriz do longa não é Stiller e sua eterna cara de azarado, e sim, a atriz sueca Malin Akerman. A mulher consegue passar da meiguice ao histrionismo com a maior naturalidade do mundo. É com ela que estão as cenas mais engraçadas. De namorada dos sonhos, ela se transforma em pesadelo de esposa. Só que, quando tudo ia bem, no meio do caminho surge Michelle Monaghan como uma luz no fim do túnel do protagonista. Pois é, foi a partir daqui que o filme se perdeu tentando se encontrar. Nada contra a moça, ela até que é boa atriz. Mas o seu semblante, em determinados momentos, evidencia bem a situação: ela não queria estar ali. Como disse bem minha esposa no fim da sessão, “a outra sempre atrapalha e estraga”.

Mesmo com algumas cenas hilárias em sua segunda metade, o foco principal virou a busca pela mulher ideal e uma nova chance para o amor. Blá, blá, blá. Se a trilha sonora pop encanta (com meia dúzia de clássicos de David Bowie), a química entre Ben Stiller e Michelle Monaghan desencanta. A redenção do protagonista se torna a maldição do filme. E apesar do final boboca, fique atento aos créditos finais, onde a suequinha ninfomaníaca aparece no meio deles para fechar sua participação com chave de ouro. Essa moça tem futuro. Já com relação aos Farrelly, melhor sorte da próxima vez.

NOTA: 6,0